A primeira experiência ligada à maternidade provou-se dramática para Elizabeth mas também foi a partir dessa experiência que nasceu a escritora. Na sua primeira gravidez, a criança do sexo feminino nasceu morta e, receosa que acontecesse novamente, na gravidez seguinte, ela iniciou um diário onde escrevia tudo o que se passava com ela e mais tarde com a sua primogénita Marianne, nascida em 1834. Em 1837, nasce Meta, a sua segunda filha e sobre essa época, Elizabeth escreve: "When I had little children, I do not think I could have written stories, because I should have become too much absorbed in my fictious people to attend to my real ones". Teria ainda uma outra filha, Flossy, nascida em 1842, e um filho, William, nascido em 1844 e falecido dez meses depois. Em 1846, nasce a última filha, Julia. Aquando da morte do seu filho William, foi o marido que a incentivou a recomeçar a escrever para se distrair e afastar o pensamento da tragédia. E assim começou a carreira desta escritora vitoriana.
As três filhas mais velhas de Elizabeth Gaskell (Marianne, Meta e Flossy)
Imagem retirada daqui daqui
Em 1837, morre a tia Lumb que lhe deixa uma pequena herança. Isso aliado à melhoria da situação financeira do marido, permite-lhe começar a viajar. Entretanto, começa a publicar textos anonimamente e depois sob o nome de Mrs Gaskell (ao contrário das suas companheiras Austen e as Bronte, mulheres solteironas e párias, Gaskell era uma senhora casada, com filhos e completamente inserida na sociedade, o que lhe trazia muito mais estatuto que às amigas, daí ter optado pelo nome de Mrs Gaskell). Passa a ir muitas vezes a Londres, sem a presença do marido que se mantém em Manchester, cultivando um estilo de vida diferente daquele que se espera de uma esposa vitoriana.
Torna-se então famosa e amiga de Charles Dickens. A sua primeira obra Mary Barton estabelece-a definitivamente como escritora apesar de criticada por retratar apenas um dos lados da revolução industrial e da depressão económica.Quando começa a publicar na revista Households Words de Charles Dickens, numa época em que a literatura é bastante consumida, torna-se numa referência para a faminta classe média com os seus textos seriados (excertos publicados com determinados espaço de tempo e que fazem parte de uma mesma história). Em 1850, já estabelecida na revista Households Words de Charles Dickens, compra uma casa, em Plymouth Grove, Manchester, para toda a família. Aí escreveu obras com North and South e Cranford.
The Gaskell house at Plymouth Grove in Manchester (via Wikipédia)
É também em 1850 que conhece Charlotte bronte de quem se torna grande amiga e por quem sente uma grande compaixão. Sobre ela escreveria The life of Charlotte Bronte, a pedido da própria, e onde pretende honrar aos olhos do mundo a mulher que todos admiravam como escritora. Contudo, a inserção de alguns factos incorrectos trouxeram alguns problemas a Gaskell que foram, no entanto remediados numa segunda edição desta obra, tornando-a num dos grandes clássicos de Elizabeth Gaskell e numa biografia soberba de Charlotte Bronte.
Sobre a sua relação com Charles Dickens, sabe-se de um mal-entendido passado por causa da obra Cranford. Elizabeth fez com que o fictional Capitão Brown fosse um apreciador da obra de Dickens The Pickwick Papers; no entanto, Dickens alterou essa parte da história sem o conhecimento de Gaskell, tornando a personagem apreciadora dos Hood's Poems. Gaskell não gostou da alteração, tendo ficado muito zangada e por isso Dickens desculpou-se, não querendo perder a amizade e o trabalho de Gaskell. No entanto, pouco mais tarde, ambos desentenderam-se novamente por causa da obra North and South, tendo Dickens mencionado que 'Mrs Gaskell showed a total disregard for the basic principles of serial publication, punctuality and regulation of lenght'. Apraz-me, contudo, saber da opinião de Mrs Gaskell sobre North and South (que, não fosse o desagrado de Dickens, se chamaria Margareth Hale) que, após a série de publicações, escreveu 'I meant it to have been so much better'. No entanto, foi a pressa de publicação de Dickens aliada à falta de profissionalismo demonstrado por Gaskell em edições anteriores desta obra, que originou o final tão apressado e quase forçado.
Ruth, uma história que foca problemas morais, sociais e sexuais da sociedade de então, é publicado em 1853, recheado de situações melodramáticas. Apresenta-nos a história de uma mãe solteira e a hipocrisia daqueles que se julgam religiosos e a quem falta compaixão, humildade e caridade cristã. Obviamente que este livro gerou um tumulto social muito grande mas Mrs Gaskell sabia no que se tinha metido e a coragem para escrever esta obra continuava expressa numa carta que escreveu a uma cunhada: 'Of course it is a prohibited book in this, as in many other households... but I have spoken out my mind in the best way I can, and I have no doubt that what was meant so correctly must do some good'.
Em Roma, Elizabeth Gaskell conhece Charles Eliot Norton, um estudante de História da Arte, dezasseis anos mais jovem que ela e ambos se sentem imediatamente atraídos um pelo outro. Dela, ele afirmava '...like the best things in her books; full of generous and tender sympathies, of thougtful kindness, of pleasant humor, of quick appreciation, of utmost simplicity and truthfulness...' Esta amizade permaneceu sem que invadisse a vida de casada de Elizabeth ou a sua devoção ao marido e à família.
O último trabalho de Elizabeth Gaskell, Wives and Daughters estava a um capítulo do seu final quando ela faleceu,em Novembro de 1865, vítima de insuficiência cardíaca, nos braços da filha Meta, na casa que comprara secretamente em Alton, Hampshire, com a secreta intenção de convencer William, o marido, a deixar Manchester e a retirarem-se para Londres na sua velhice. A típica senhora vitoriana com uma atípica vida vitoriana, morreu longe do seu marido, que num mesmo dia soube não só do seu falecimento como da existência da nova casa. Crê-se que, com esta última obra, Mrs Gaskell tenha atingido um alto nível de maturidade artística. Conta a história de Molly Gibson, filha do médico da aldeia, numa brilhante, evocativa e irónica imagem da vida provinciana e da depois segunda mulher do seu pai, Mrs Kirkpatrick, uma mulher fina, vaidosa, egoísta, superficial e doida.
The Gaskell Grave, Brook St Chapel, Knutsford
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Destaca-se que, aparte o seu estilo de vida pouco convincente socialmente, Elizabeth Gaskell contribuíu significativamente para a Literatura Inglesa, tendo sido subestimada e esquecida ao longo dos tempos. Escreveu maioritariamente sobre as mulheres da sociedade vitoriana e de como viviam em perigo de se tornarem párias. Contudo, apesar de tão importantes temas, Mrs Gaskell não é incluída em currículos de Literatura e não é famosa como devia ser.
Continua.....